O primeiro ponto de insight para inovar são seus clientes e não clientes. O olhar junto às necessidades reveladas e não reveladas deve ser constante.
Seus atuais clientes são uma fonte primária de ideias para seu negócio, mas também pode-se considerar os não clientes que, por algum motivo, não consomem da empresa, compram produtos de um concorrente ou mesmo de empresas de outro setor.
Por não ter condições financeiras, muitos brasileiros não viajavam de avião. Era em parte uma necessidade evidente, mas por outro lado, não revelada. Até então, 95% dos viajantes eram passageiros frequentes contra apenas 5% de novos passageiros.
A GOL percebeu essa necessidade, a mudança do comportamento de consumo e o surgimento de novos clientes em função do crescimento econômico. Introduziu o modelo de baixo custo / baixa tarifa, pioneiro no Brasil, que mudou essa realidade permitindo operar com preços baixos sem inviabilizar a rentabilidade.
O desafio da inovação está em não apenas ouvir o cliente, mas entender e interpretar seus sinais mais sutis e menos evidentes.
Como disse Henry Ford, depois do desenvolvimento do Ford Modelo T, que revolucionou a indústria de transporte: “se tivesse ouvido meus clientes teria feito uma carruagem com mais cavalos”. É provável que se a GOL tivesse perguntado aos passageiros de ônibus o que eles queriam, muitos teriam respondido um ônibus mais confortável, barato ou veloz.Nem sempre os clientes querem, conseguem ou podem articular com clareza aquilo que irão comprar. Para inovar, é necessário ir além dessa superficialidade para compreender, em profundidade, o contexto de consumo, suas nuances e características.
O Chef Ferran Adria, dono do Restaurante El Bulli, perto de Barcelona – ESP, considerado o melhor restaurante do mundo, expressou em um case da Escola de Administração de Harvard sua visão sobre o tema, “primeiro vem a criatividade, depois vem o cliente”. Entendemos que não há uma ordem lógica nessa equação. Do cliente para a criatividade ou da criatividade para o cliente. O importante é que haja química e contato com o cliente para gerar insights que se transformarão em oportunidades de inovação.
Uma frustração ou necessidade não atendida do cliente pode servir de base para uma nova oportunidade de negócio.
O segredo para desvendar as necessidades reveladas e não reveladas está em interagir com clientes e não clientes em seu contexto de consumo. Para tanto, nossa experiência sugere que a melhor forma é o processo de observação direta dessa realidade. A etnografia, técnica de pesquisa social que integra o pesquisador ao objeto de pesquisa é, nessas situações, a forma mais eficaz de desenvolver tais insights. Não há melhor alternativa do que vivenciar a situação que seus clientes enfrentam com seu produto/serviço ou mesmo com as alternativas dos concorrentes. A Procter & Gamble tem enviado seus executivos para passar algum tempo lidando com as mesmas questões que seus clientes para compreender suas necessidades e identificar oportunidades além daquilo que eles conseguem manifestar.
O foco dessa interação deve ser direcionado para compreender o “trabalho a ser feito” ou o “job to be done” dos clientes. A teoria nos diz que os consumidores contratam empresas para “realizarem um trabalho” para os problemas que eles enfrentam em suas vidas. Ao invés de focar o consumidor, a atenção deve estar centrada no entendimento do “job to be done” do cliente, ou seja, no trabalho a ser feito.
Para aprofundar essa avaliação uma ferramenta oportuna é o mapeamento da cadeia de consumo do cliente. O processo de consumo é uma cadeia com diversos elos. Da identificação da necessidade de compra de determinado produto/serviço até seu descarte ou repetição do consumo. Cada um desses elos apresenta diferentes oportunidades de inovação. O modelo da cadeia de consumo de Rita McGrath pode ser uma ferramenta importante para identificação dos elos, mapeamento de onde reside o valor e quais as possibilidades.
A XP Investimentos, uma das líderes do mercado de corretoras de ações no Brasil, percebeu que era caro, difícil de acessar e muito sofisticado investir em ações no Brasil. A empresa aproveitou as principais restrições ao consumo e desenvolveu um modelo de negócios baseado na educação dos consumidores e em pontos de venda acessíveis, baseado em agentes autônomos para quebrar as restrições e criar um novo mercado.
Vivenciar a realidade dos clientes é a melhor forma de ver o que ninguém vê e acessar novas
oportunidades de inovação.
Entender qual o “trabalho a ser realizado”
e desmembrar a cadeia de consumo
podem ser formas de sistematizar essa busca.